Fisiologia do Tédio
Ó carne de meu negro ser sem fundo,
Tu que o terror do meio externo injetas
Em meus nervos morosos, como setas
Alvejando-me o cérebro infecundo...
Ó corrupta e funesta portinhola!
Habito este tugúrio sob a tez,
E muita tempestade o já desfez,
Mas o tédio, somente, hoje me assola.
Os vínculos, outrora bem firmados,
Entre as idéias num painel bem posto
Derretem-se e depois são degustados
Por estes parasitas do Desgosto,
Que espargem no meu sangue pela mente
Este misto de chama e de langor,
Produto de sinapses em torpor
E em fúria meditando esterilmente.
Vou com meu ópio me deitar aqui,
Transportado a um deserto oriental:
Imenso nada que se basta a si
E pode me alegrar sem Ideal.
Minha pele nervosa então repousa
Em nova forma de existir, de sorte
Que, alçando ao mais remoto, logo pousa
Num páramo entre as fúteis Vida e Morte.