= HERÓI =
Amanhece e é sábado.
E tudo já foi há muito tempo.
O último herói partiu na overdose de vida,
no exagero de amor, no escancarar da loucura,
sapiência e coração
Haveria ainda mais o que dizer?
O penúltimo herói partiu no esquecimento que deságua todo o furor da idolatria.
Agora, de novo, sou eu pela vida.
Mais pela cabeça que pelo coração.
Mais pelo instinto que pela preservação.
Agora sou eu.
Fiz-me meu próprio herói, deverei portanto, ser o último a partir.
Tenho na cabeça um mito,
na alma a coragem de dizer: Estou aqui.
Que venham os fatos!
Pois a vida há muito tempo já está.
Sempre esteve, desde a criação do mundo.
Rezo a Deus, me exponho ao Diabo,
há que chegar-se à vitória,
posto que correm em minha veias todas as seivas que a uma alma convem carregar.
Creio que logo voltarei à selvageria de quando criança.
Aprendi que o meu corpo abriga o casulo que abriga a alma que abriga o animal domesticável passível de desconfiança.
As guerras existem
porque todo homem carrega em si uma batalha.
A manhã traz cadáveres e vítimas
porque a briga nasce na alma, cria-se no lar e explode no incauto desatento, mais próximo e azarado.
Eu descobri na noite, num canto qualquer do meu espírito,
um puríssimo animal.
Daí começo a passos lentos, dados repentinamente a ser gente.
Alô herói, onde quer que você esteja: Bom dia!
Mito meu que também partiste,
que em minha cabeça ainda resiste,
aproveita o sábado,
que um dia ocuparei o seu lugar
eu não mais cometerei o erro de me debruçar sobre minhas imagens...
31 novembro 1990