Que Poesia?
Por que esta poesia de pedra,
Que ressoa nos tímpanos,
Sem qualquer som agradável?
Por que esta poesia tecnológica
Que me apraz e faz os versos cinzentos,
De puro fel de uma dor que não existe?
Por que esta cor cartesiana
A esconder colorações imperfeitas
Dos interiores invisíveis?
E pensar que tudo isso é ilusão,
Tanto em céu, tanto em asfalto,
As pedras e os elevadores,
Os edifícios ao alto
E as mentes cá embaixo,
Sorrateiras, como lontras no cios.
Ora, o que esperamos ser
Com esta poesia de escritórios,
De úmidas visões líricas,
Como a sobrevoar casas e sonos,
Tentativas vãs de conter o universo.
Os computadores, os números,
As contas exatas,
A mensuração de tudo e todos,
Uma poesia distante dos rostos,
Tela imberbe que nada penetra,
Sonolenta e tardia,
Esqueceu-se das praias,
E das marés e das noites
Que pulsam como são,
Sem as pedras contadas como tijolos,
A construir poesias de treliças,
Subterrâneas e gélidas.
Não, meus senhores, construamos
Uma poesia que se sustente por si,
Que seja a vertente do mais íntimo essencial,
A poesia que se revela em cada espaço vácuo,
Entre nossa mente e as pedras que não falam.