INQUIETUDE URBANA

INQUIETUDE URBANA

Naquela rua me recordo das pessoas sentadas nas calçadas;

Das bocas abertas, das línguas ocupadas, das vidas mal faladas.

Naquela rua havia uma mulher; uma velha senhora de ar muito pouco para poder dizer.

Sua asma a impedia, ou de noite ou de dia de fazer o que seus irmãos faziam sem o perceberem.

Naquela rua abri uma porta para viver com homens.

Quando me viram fecharam as suas e se pudessem, a rua.

Andei pelo calçamento velho, batido por demais sofrido de suportar o peso de tanta gente.

A rua, um dia cansou, protestou, gritou a infâmia humana.

Aqui é rua de banana, de coentro, cavalo solto, peão e ninguém segura o vento.

O vento que levanta a poeira; a poeira que fere os olhos, os olhos que perdem a visão.

Um dia arranquei uma pedra da velha rua.

Ela não me disse nada.

A guardei em meu baú - uma velha e pesada peça de madeira.

A pedra foi esquecida.

Mudamo-nos.

Fomos para outra rua melhor construída.

As casas eram de lei, e as pessoas todas bem parecidas.

Não havia gente nas calçadas, nem gritos desesperados nas madrugadas.

As coisas eram muito bem arrumadas.

Tão arrumadas que o tédio tomou conta de mim.

Lembrei-me da pedra da rua velha de gente feia, e da mulher asmática.

Joguei-a ao chão limpo e bem varrido e fechei a porta atrás de mim...

Roosevelt leite
Enviado por Roosevelt leite em 20/12/2012
Código do texto: T4045417
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