Simples Viver

Venho de vida simples.

Com chão de terra batida

E sonhos alicerçados em pau a pique.

Das modernidades quase não entendo.

Mas, me pergunte uma reza, uma cura,

E eu lhe mostro minhas sabedorias.

Dos meus mais de setenta e tantos anos

Guardo, além das rugas, o pouco que a vida me ensinou.

Aprendi na marra, com garra...

E nem pestanejar eu pude.

Não me foi permitido fraquejar.

E talvez seja por isso que posso me olhar

No caco de espelho pendurado atrás da porta simples.

De simplicidade fez-se meu viver.

Uma delicadeza de entendimentos

Que pouco necessitava de maiores entenderes.

Bastava um olhar diferente,

E lá estava eu a compreender tudinho!

Trago no espírito a poeira das vidas.

Todas impregnadas nos poros.

Por vezes, me encarno nelas.

Noutras, os banhos de rio me lavam por completo.

E de alma lavada é possível enxergar o mundo.

Com toda a simplicidade necessária

Sem firulas, sem fissuras ou brechas.

Sem os adereços purpurinados que só confundem,

E não enfeitam nada!

E de enfeites só o altar lá de casa!

Tão simples nos adereços.

Tão fielmente devotado, todos os dias.

Antes de ir à lida, na madrugada,

Acendo a vela pequenina.

Pedindo à Mãe Divina toda a proteção.

E proteção nunca é demais!

Ajuda a erguer a cabeça

Em dias de amargar os olhos.

Venho de vida simples.

Com chão de terra batida.

E coração um pouco batido, também.

Pelas poeiras do tempo.

Pelas amarguras do vento.

Pelas consolações e desolamentos

Que a vida insiste em ofertar, quando raia o dia.

Venho de vida simples.

Quase uma pintura pitoresca de obra de arte.

Daquelas de se estampar paredes de alvenaria branca

Com sofá macio e imponente a sentar.

Coisa que não sei bem o que é.

Aqui só a cadeira de balanço velha

E o rádio a pilha, a postos,

Para as modas de viola

E as rezas de Ave-Maria.

A vida se fez assim.

E posso dizer a você, meu jovem,

Que não a trocaria por riqueza nenhuma.

Porque riqueza não se compra nas Casas Bahia.

Conquista-se com o lutar d’alma.

Matando um leão por dia.

E fazendo dele tapete da sala.

Seja de rico, para ostentar.

Seja de pobre, para baixar a poeira.

Então, conquiste a sua.

E só depois ecoe a tão sonhada felicidade

Que se faz almejar em seus sonhos todos.

Conquiste-a.

Antes que você perca os dentes e os sonhos.

Antes que se esqueça do modo mais simples

Para caminhar de pés descalços.

Sem feri-los com as pedras do caminho.

Conquiste-a.

Ou então só lhes restarão as rezas e a cadeira de balanço.

A confortar-lhe a alma.

Apenas isso.

E nada mais...

HELOISA ARMANNI
Enviado por HELOISA ARMANNI em 29/08/2013
Código do texto: T4456884
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.