Amor Primevo
O Céu é o altaneiro pai da Terra;
ao soberano Sol concedeu a sua mão;
mas contra a isso a sua liberdade berra
e ao poderoso pretendente diz um sonoro “não”!
A Terra ama o Mar
e o Mar ama a Terra;
É amor que pulsa a gritar!
Amor que cada um no âmago encerra.
O Céu não consente nesse amor!
Ele diz: “O sol está acima de tudo
e de todos é absoluto senhor!
Cada qual não fala e fica mudo
quando ele fala e todos ouvem!
Ele ama a Terra e dele ela é!
Ele é deus de todos e que todos o louvem!”
Mas Terra e Mar professam outra fé.
O Mar enfrenta o Sol,
lançando-lhe ondas imensas;
Aquele se ri de seu inútil esforço em prol
de apagar suas chamas intensas.
E o Sol se enfurece,
aquecendo-se ao máximo!
Nisso o Mar se enfraquece
e imóvel fica, assim como tácito.
Com o excessivo calor
as águas do Mar evaporam,
elevando-se ao Céu, escravo do Sol, o seu Senhor,
e logo acima os raios imploram
a cada trovão o seu máximo estentor!
E assim os trovões fazem,
exibindo dantesca cena de horror
com medonha tempestade que ora espargem!
É o Céu em fúria
que auxilia o Sol inclemente,
indo contra a ousada injúria
lançada pelo Mar à Estrela do Eternamente!
A Terra assiste emudecida
o sofrimento de seu amor,
e chora toda entristecida
por causa de sua sofrível dor.
O Céu, ao ver a filha tão triste,
com isso se comove
e das Nuvens irmãs ribombam raios em riste,
e cada Nuvem então se move
para fazer o Céu ainda mais se comover,
e eis que ele não se contém,
pois o sofrimento da filha está a ver;
afinal, o sangue dela é dele também.
E em prantos põe-se a chorar,
chorando mui copiosamente;
e suas lágrimas banham a Terra e o Mar,
os quais se unem mais e mais intensamente!
Afinal, suas águas crescem
e ele une-se à sua amada.
As Nuvens então se enternecem
e cada uma observa calada
aquele amor de todo comovente;
e o Sol vê-se vencido
por esse mesmo amor ali presente
que por fim o deixa convencido.
O Sol amaina a sua fúria,
o Céu aos poucos deixa de chorar;
o Mar e a Terra vencem do Sol a sua luxúria,
e o seu legítimo amor ainda há de encontrar.
E o Céu o Mar reflete
pela luz do Sol brilhante,
cujo ódio nele arrefece,
substituído pelo amor revigorante.
A Noite surge,
juntamente com a Lua, sua irmã;
O amor nesta urge!
É jovem e de alma afã.
Eis que o Sol a conhece
e o seu amor ressurge!
Esse sentimento que tanto enobrece,
e no âmago de ambos fortemente insurge!
Então, ambos se unem em amor
e o Dia Claro se torna em Noite Escura,
até que Sol e Lua amainem o calor
desse nobre sentimento que a tudo cura.