Mediocridade
emaranhado num jornal da semana passada
que fala sobre a crise no brasil
o homem que dorme na calçada
do maior shopping de natal
não percebe o olhar turvo
da moça do carro cinza
que chora desesperadamente
ao lembrar da filha
que deixou na clínica clandestina
a recepcionista
sentia-se culpada toda vez que alguém saia daquele jeito
com seu salário abaixo do mínimo
resmungava para o filho mais velho
ao fim da noite
"só fico lá até encontrar coisa melhor"
ele não prestara atenção
apenas comia a sopa de feijão com torrada
pensando que amanhã
talvez nem estivasse ali
estava devendo dois mil e quinhentos a um tal de perna
traficante meia boca
que vive de assaltos baratos a ônibus urbanos com destino ao vale dourado
bairro em que mora um tal poeta inútil
branco
hétero
de classe média
que escreve coisas fúteis
enquanto sua única preocupação é sofrer pelo amor
que o deixou semana passada