Compro diariamente cadeados médios e pequenos
para lacrar bem meus pais dentro de mim.
Seus cliques fechando-os me fascinam e tranqüilizam.
As chaves, lanço-as no alto mar do Inconsciente.
Eles daqui não fugirão, por certo,
vivos e solícitos e severos e carinhosos como sempre.
Ainda assim, tenho medo:
e se se acabarem os cadeados todos da Terra?
Se o meu dinheiro, pouquinho, findar?
 
Depois sorrio, gargalho, triunfo interiormente:
Margarida e Francisco possuem dois túmulos:
o do modesto cemitério de Nova Iguaçu,
Estado do Rio de Janeiro, Brasil,
onde jazem vazios de ânsias e sonhos
há mais de sete anos,
e o meu coração, em que permanecem
vivos, solícitos, severos e carinhosos como nunca.
Abraço-os assim na distância
que tudo indetermina e enternece.

Jô do Recanto das Letras
Enviado por Jô do Recanto das Letras em 21/08/2011
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