PALAVRAS CAÍDAS
Encontrei muitas palavras
Caídas no chão
Algumas delas estavam tortas
Outras quase mortas
As olhei com curiosidade e espanto
Aproximei-me e algumas se assustaram
Outras se quedaram em uma enorme tristeza
Perguntei o que aconteceu
Mas, responderam-me sem certeza
Aproximei-me um pouco mais
E uma delas foi extremamente hostil
Agachei-me pra falar mais perto
Num gesto controlado, gentil
Outras me tocaram com suavidade
Senti certa nobreza nos seus gestos
Então insisti em saber por que daquele abandono
Elas pareciam perdidas, sem espaço, sem dono
Mas palavras têm dono
Refleti, e insisti na busca de uma razão
Pra aquele estado de coisas, aquela desolação
Então uma delas falou:
Fui atirada aqui por um bêbado,
Que depois de me transformar num palavrão,
Caiu na calçada!
E outra falou: Eu também fui jogada aqui
Por alguém que se desiludiu que foi deixado por sua amada!
Então outra falou que foi abandonada ali
Por que sonhos se perderam no caminho
Ideologias, projetos, nada tinham mais valia...
E agora numa sinfonia de vozes falavam
Em desamor, desencantos, em desarmonia, em lamentos,
Choravam em prantos
Da forma que foram usadas, ultrajadas
Em total vilipendio, e jogadas na rua, na lama
Quando muitas vezes elas foram usadas
Nos jardins, nas belas mesas e entre lençóis de seda na cama
Pobres palavras abandonadas...
Então as peguei e as coloquei no colo,
Estendi a minha mão pra que elas a tocassem
Ofereci o meu ombro pra que elas acalentassem
E as juntei numa clareira à frente limpa e límpida
E construí poemas e sonhos, e ergui cabanas e casas
E novamente voltaram pessoas
E novos projetos surgiram, dançaram, cantaram
Enquanto a brisa soprava enquanto a chuva caia
Enquanto o sol surgia
E abri caminhos por onde as pessoas apareciam e passavam
E, as palavras voltaram a ter som, a ter sentido a
Fazerem eco, com sons de uma orquestra
Eu continuei por aonde ia, olhava pra trás e via
A vida em êxtase, em completa festa...
BY JORGE BRITTO