desde quando tudo ainda era espera
Minha amiga é mulher madura pela vida experimentada
é vivida mas no fundo é uma menina de muitas dúvidas
ela sente o que pensa, pesa-lhe ideias confusas...
o resto de cada coisa são coisas, tudo pede complemento.
Está assim no devaneio em si mesma acomodada
quando da alvura enebriada do seu pensamento
do limbo um sentimento virgem não imaginado
cai no seu colo como do verbo o vigor da fruta
com a força da folha onde o que será inteiro é.
Numa única lágrima do sândalo derrubado há um instante
nele caberia minha amiga, a menina, a mulher e o mundo.
Será a vida mesmo sonho, apenas essa brisa passageira?
Mais adiante tal amiga assiste nascer outra ideia
é porta de folhas de cedro aberta para o depois
algumas portas terão função de janela
estão para alma aberta mas não é só isso.
Mesmo sozinha minha amiga não sente solidão
pois há tanta coisa que começa pelo que resta...
Começamos pelo fim do que não deu certo
existem coisas que não vingam mesmo surgindo com vigor
ela conclui que muitas crianças chegarão a saber.
Mas ela é mulher-menina que a si reinventa
sobre os restos apanha esta ideia que sobra
é um banco ao sol de madeira pintado de céu.
Ela se senta, desfaz o que repara e reconstrói
cunha sentido para a falta quando abre a janela
para abraçar na falta o que pede complemento.
Agora a vista dela bêbada de ver a chuva
alcança na terra antes seca o musgo ancestral
na umidade aquecida habitam formigas desconfiadas.
Minha amiga diria mais tarde que tentou escrever um poema
diz que no desalinho dos pensamentos que não são sentidos
muitos passam suas vidas como se tivessem nascido do resto
não inventam portas nem janelas, para elas seiva não é sândalo
e o poema adormecido no rascunho jamais terá alma gêmea.
Diferente dela, eu alheio e apressado sigo dessemelhante
descuidado de ver mais de perto as ovas, larvas e formigas
no meu minúsculos universo sou parte
sou dela o que sobra, ela me completa
estamos ali juntos desde priscas eras
desde quando tudo ainda era espera.
*
*
Baltazar