AMORFINIDADE IRRAZOÁVEL

AMORFINIDADE IRRAZOÁVEL

Se hoje não te amei,

não me culpes;

foi mais por esta melancolia

inexplicável.

Esta tristeza que vem

não se sabe de onde,

inconvidada,

que como sombra,

se sorrateia por entre

as fimbrias das cortinas.

Se hoje não me visses,

não me julgues;

não pedi que a soturna nuvem

me encobrisse.

Nem quis que o canto

se calasse nas brumas

do peito.

Se hoje meus olhos

não procuraram o

oceano encravado nos teus,

meu barco se negara, revoltoso,

a deixar o porto,

e se agarrou ao cais.

Se te neguei o beijo,

não me renegues;

livrei-te do fel

que inunda meus lábios.

Bebi de todas as bebidas

que os homens amargos

me brindaram.

Se hoje não te dei

o aconchego do carinho,

não me repulses;

recolhi a mão andarilha

e mendiga, em esquinas

sombrias.

Se hoje meus ouvidos

se fecharam às tuas

súplicas silenciosas,

não me blasfemes.

Surdei-me às insanas

vozes da minha própria

demência.

Se hoje não quis dar-te

a seiva que procuravas,

sublima,

que embora ela é inda viva,

se deixou quedar

por esta amorfinidade

irrazoável.