Discagem
Sentado, perdido nos pensamentos
Lembranças dela, das quais nem mesmo participo
Memórias gravadas ou inventadas
As palavras que eu não disse e desejaria ter dito.
E não mais que em um relance
Fito no momento a única coisa que aliviaria:
Um telefone antigo, sobre a escrivaninha
' - Por que não?', penso logo
Logo também me vejo com receio
Me aproximo, o pego, me escondo do mundo.
Por um segundo me sinto incapaz.
Disco lentamente os números já decorados
O som da discagem me aperta o peito
Me transbordo de alegria e medo
Me vejo envolto em adrenalina e deleito
Fim da discagem e ouço dois sons,
Duas simples repetições,
Nada mais que dois 'Tum-tuns'.
Em meu ouvido é constante um deles
Metálico, elétrico, frio e sincronizado.
Em meu corpo todo percebo o outro,
Meu desejo pulsa meu ser, agoniado
Aguardando ansioso o fim da espera
E por fim se cessa o meu suspense.
Uma voz já conhecida surge dizendo '- Alô'.
Por fim, minha alegria me domina um instante,
Em outro instante o pavor me absorve
E ponho fim ao que comecei, covarde.
Me debato, me culpo, me exalto,
E nesse momento, neste instante exato
Me encorajo e recomeço a tortura do princípio
Não aprendendo a lição, ou não querendo este fim
Aconselho a mim mesmo: 'Carpe diem...'
E aconteça o que acontecer, quando ela tornar a atender
Não desligarei, e darei o melhor de mim.