O Violão e a Princesa

Ah, abra meus olhos, meu pensamento,

Meu coração, minha sensibilidade, tudo!

Ah, abra, que já não consigo lhe fitar

Sem ficar assim, incrivelmente parado!

Embaraçado e, ainda por cima, mudo!

Tome minhas mãos, entre as tuas,

Tome-as depressa, antes que desfaleça!

Antes que a Vida voe e me deixe sozinho!

Não se intimide, pode me beijar!

Antes que o Sol nasça e você me esqueça!

A minha lira esta repleta e mesmo que

Não estivesse teus cabelos iriam preenchê-la!

Das mais sutis e singelas inspirações!

Porque sua presença é luz, é Vida,

É alegria e alento para tristes corações.

Estou chorando, mas não chore você,

Eu ponho para fora no pranto o peso

De longas noites frias e de solidão.

Já você, assim tão majestosa talvez

Não saiba nem o que significa desprezo.

Por que me abraças e me beijas, eu

Que sou somente um plebeu esquecido;

Que tenho por única companhia um violão...

Ah, não me abrace assim, nada tenho,

Você nem sonha como tenho vivido!

Ah, é o meu coração que você quer,

Acha que tem algum valor este peito?

Se acha vem comigo para os ermos

Para as cachoeiras, ainda temos tempo,

Nossa vida parece que ainda tem jeito!

Aracati-Ce., 22 de dezembro de 2006.

André Breton.