Noturno

Alguns fantasmas

espreitam-nos no alpendre.

O cheiro de mato cortado

sinaliza a noite chegada.

Na sala, ao lado do Oratório,

o branco da parede

sustenta teu retrato;

e ainda que inútil,

nele,

eu beijo tua ausência calada,

antes de caminharmos

pelas ruas das Minas

em paga das minhas sinas.

Andarei meio-mundo

e tu estarás comigo.

Ouvirei teu silêncio

e sentirei tua mão.

Saberei quando tu se deixar

absorta a contemplar

o gerânio recém florido;

e adivinharei teu riso

ao sentir que o pequeno cão

reconhece-te como herdeira da vida.

E ainda saberei de tua fadiga

quando a volta te apetecer.

Quando o fogo do Mundo

já não te aquecer.

Levar-te-ei Princesa ao

pobre Palácio sem fausto.

E após reclinar-te no leito,

velarei que os fantasmas não

ultrapassem o portão.

E te direi que durma, minha querida.

E que sonhe com a vida.