No sofá marrom

No sofá marrom da sala

Deito meu jeito, solto meu peito

Entrego lágrimas, escrevo páginas

Despejos meus sonhos, ensejos

Refaço planos, contabilizo danos

Lá revejo meus passos, cultuo abraços

Relembro o beijo que ainda não dei

A palavra que nunca falei

Minha voz que não escutei:

No sofá marrom meu coração é rei

Recupero, tácita, a tal lucidez

Renuncio a quem mal um dia fez

Perdôo a mim, à minha culpa

(essa tirana, essa maldita

grudada em meus calcanhares

qual alma desgovernada

antes perdida de tão aflita)

No sofá marrom da sala

Regurgito o que me avassala

Sem armadura em minha loucura

Não meço palavras, não sou ameaças

E voando liberta da frágil clausura

Retifico do passado as tolas trapaças

Sem medos, sem pesos, sem parcos segredos

Sabedora do caminho inda longo e contumaz

Minha verdade exponho, contrita:

No sofá daquela sala encontrei minha paz.