Vou... e vôo

... tivesse Neruda um verso que me descrevesse, seria: Como uma pomba ela pousou perto dos meus pés e arrulhou lentamente. Comeu na minha mão e depois pousou nos meus ombros e carinhou meu rosto com sua cabeça de penas quentes...

Tivesse eu, nesse frio, do teu lado, lendo os mesmos livros, bebendo o mesmo vinho, ouvindo a mesma canção e seria a pomba menina a encostar minha cabeça no teu ombro deixando que meus cabelos brincassem com teu rosto. Tivesse eu nessa paisagem focando a mesma montanha fria e o mesmo azul e seríamos apenas crianças olhando os Andes e depois... depois seríamos um homem e uma mulher entregues à luxúria das notas de um instrumento...

Tivesse, agora, asas para voar mais longe...

... iria ao teu encontro buscar alimento

um pouco de sustento

para o meu dia-a-dia

iria com asas ligeiras

tentando abrir trincheiras

antes de acabar o dia

nada interessaria que não fosse teu nome

nada buscaria que não fosse a fome

de voltar para o meu amor

seria uma águia solitária voando de esgueiro

tendo apenas o teu cheiro,

em meu faro, e o teu sabor

seria águia com jeito de pombo-correio

levando na pata um bilhete entremeio

só com teu nome escrito

e, se abatida fosse, se morresse agora

haveriam de saber pelo mundo afora

que era você o meu último grito