Perdida
Todas as noites
Embarco no mesmo ônibus.
Eu só quero ir pra casa.
Passa ponte, ânsia.
Passa semáforo, apreensão.
Passa curva, agonia.
Passa comércio, aflição.
Passa grafite, suplício.
Para no ponto, consternação.
Arrancada brusca.
Corre ônibus.
Não para.
Muda a rota de ontem.
Me tira dessa eterna estrada.
Esse motorista
Não entende quando digo:
- Leve-me à minha morada.
Ele me conduz toda noite
A um número estranho,
Anotado em papel timbrado,
Reconhecido em cartório,
Diz ser um contrato firmado.
- Veja minhas lágrimas, moço!
Leia em meu coração!
Minha verdadeira residência
Não tem CEP, número ou direção.
Tudo que eu tenho é um papel velino
Com versos envoltos em dor.
Ele diz que meu lugar
É nos braços daquela mulher.
Me ajude, seu moço.
Me leve pro meu lar.