Se os dedos falassem…

Se os dedos falassem…

Ah, os dedos falassem…

Olha… Diriam

Que as cores dormem contigo…

Que essas cores te arrebatam naquele olhar de corpo luxurioso…

— exuberante na vontade —

— pujante de uma emoção marinha em orvalhos fulvos e cinzelados a desejo —

Se os dedos falassem…

Contar-te-iam

Recostos suaves e provocantes ao trémulo frémito do teu sabor…

Contar-te-iam

O ondular suave do teu realce divino, ruborizado pelo ímpeto da vontade

— perturbação mimosa e menina em teu corpo inteiro de mulher —

Se os dedos falassem…

Iriam explorar as tuas mãos,

Vestidas de cânticos por detrás das pétalas dos teus lábios…

— brilhando silenciosamente… no seu suspiro afogueado —

— escondendo o encanto de interiores refrescantes como cálices em brasa —

Se os dedos falassem…

Ah, se os dedos falassem…

No céu parado e secreto da vontade,

Iriam reler os lados provocantes dos teus olhos em lua crescente…

Transportariam as janelas em teu corpo molhado e oscilante,

Pousado na nudez de um perfume laureado a amante em fragrante espasmo…

Ah, se os dedos falassem…

Saciaria demoras passageiras de indignação

Caminhando nas chuvas inquietas do tempo partido do Bizet…

E despertaria nos sonhos estendidos de uma Carmen que me lembrasse o sussurro do poeta

Se os dedos falassem…

Ah, se os dedos falassem…

Quereria ter uma porta aberta… enleio para o teu sorriso perfumado pela memória…

Abre-te

E diz-me para permanecer sempre em ti…

(DIONÍSIO VILA MAIOR, in "Cântico Atlante", Coimbra, Pé de Página Editores)