Naquela noite
Naquela noite
Teria bebido
O vinho no teu cálice.
Naquela noite
Ter-me-ia oferecido ao ardor de ânimos reservados
Com sabores a desejo encoberto
Onde o tempo, suspenso, libertasse mistérios enfeitiçados...
Naquela noite
Ter-me-ia envolvido à harmonia de pensamentos
Consentidos...
Reservados...
Procurando o retorno desejado do toque essencial tecido no silêncio dos teus dedos...
Naquela noite
Teria sentido o prazer
De tomar conta da memória do momento…
Entrelaçados...
Teria esquecido a alma
E repousado as asas do instante nos teus ombros...
Naquela noite,
Na vontade recíproca da quietude
E da entrega
Teria vestido a tua pele
E sentido o desejo
Como quem pede à lua que cante um bolero subtil
À tua voz sensual
E ao teu doce sorriso...
Naquela noite,
Teria recebido
A madrugada
Em frémitos desobrigados e vertigens soltas
Na fogosa dança dos beijos insubmissos.
Naquela noite,
Sabes?
Amaríamos
Por um momento a eternidade
Beijaríamos,
Coniventes,
A vital energia
Da música...
Da poesia...
Das lágrimas...
Dos lânguidos desejos
Sensuais
Sem sermos cativos da razão!
Naquela noite,
Sabes?
Os olhares esquivos
Seriam coniventes
Com o ímpeto da delícia...
Tão indispensável!
Num afrodisíaco passear por corpos desarmados
A fulgência de uma arte que se vai aprendendo
Por entre ébrios murmúrios que tocariam o céu
De todos os teus LÁBIOS insinuantes...
Veludosos...
Dos teus olhos cerrados
Desnudando longamente a envolvência da fusão daquele momento
Que seria só nosso...
Naquela noite,
Sabes?
Desalojaríamos a noite dos decretos sociais...
Dentro de nós, rendidos
À viagem pelos refúgios voluptuosos... furtivos...
Pediríamos licença ao prazer
E, em cansaços supremos,
Ter-nos-íamos reclinado e
Tocado as estrelas.
Ah, naquela noite!
Poderia dizer-te tanto…
E seriam tão poucas, as palavras!
(DIONÍSIO VILA MAIOR, in "Cântico Atlante", Coimbra, Pé de Página Editores)