Cântico atlante

Quando me dizes em silêncio… Ah, canto de sereia dedicada ao fluxo atlante e divino…

Quando sorris… Na praia do teu corpo encontro a paz láctea dos lábios molhados e essenciais

Quando sorris, aprumas um poema… Ah, instintivamente perder-me no frémito do teu rosto!

Quando acarinhas… E beijas, suspensa, sem a desordem do tempo no céu da boca

Quando acarinhas… Seduzes o balanço erótico das palavras

Que me cativam em ausências… compassadas…

Quando possuis…

Recolhes sensualidades despertas num enlevo de enredos lendários e frenéticos

Na harmonia excitada dos gestos seguidos…

Nos beijos libertinos com sotaque a volúpia…

Quando te palpito… exposto…

Sem a sentença insincera e abusiva do último beijo,

Arquejo ao timbre compassado e libidinoso da tua língua,

Vibrando cânticos humedecidos em deleitoso frenesim,

Ardente atrevida, que me visita com a melopeia orvalhada do desejo!

Quando te sinto… adivinho as tuas mãos e sou capaz de ver um ardor ritual de toques inaudíveis

Quando adivinho as tuas mãos, pouso-me no mar do teu ouvido e no oceano dos teus cabelos

E faço juras desveladas ao sopro de uma civilização antiga.

E, de repente, embebendo-me no gracioso cálix entrelaçado de tuas pernas,

Experimento o desejo adiantado dos teus seios

E, nesse desejo tenro e vigoroso, os corpos se acrescentam… e contradizem o mistério!

Quando, brilhante realidade de mulher, perduras na tua graça erótica sem limites

E gemes, e suspiras, e estremeces no mais genuíno silêncio de sons atravessando guitarras distantes

E, numa imagem sem assinatura, te aconchegas em retornos desejados e trémulos

Com teus rubicundos lábios em doce estremecimento… enlaçados… e desenlaçados…

Então, o meu corpo e a minha alma retribuem em uníssono,

Convocando-me, para sempre, num beijo flamante, a harmonia de toda a minha existência…

(DIONÍSIO VILA MAIOR, in "Cântico Atlante", Coimbra, Pé de Página Editores)