AO AVESSO

Eu fecho os olhos para ver meu avesso, o lado dos segredos,

E me deslizo por dentro em pensamentos,

Como os assobios dos bambus açoitados nos ventos das tempestades,

A mente um lago negro doce que não conhece o amanhã,

E meus pés não parecem mais no chão, eles estão flutuando,

Sou eu quem danço como os lábios de um poeta,

Que sente a febre queimar, e descreve-a como calmaria, sem que se perca a intensidade,

Em algum lugar do nada, onde o vácuo não conhece o tempo,

Nem passado, nem futuro e o presente quem sabe é somente ilusão,

Eu fecho os olhos e fujo do mundo, mas algo não me deixa em silêncio,

É o coração, batendo em seu ritmo, eu estou vivendo, mas já senti como quem sobrevive,

Estou em meu avesso me distanciando de tudo que conheço,

E eu que até ontem era um desconhecido de mim,

Enquanto pisava em cinzas do que havia restado,

Talvez um anjo estivesse me olhando, velando pelo corpo vulnerável,

Parece um corpo solto, caindo em seu mergulho, mais escuro, perdendo a respiração,

Mas no limite eu respiro, lentamente eu respiro, e no suspiro eu sinto o ar,

Abro os olhos e vejo que todas as cores me esperavam,

Elas se espalhavam e se misturavam, elas nunca se ausentaram,

Agora vejo e percebo que quem se tranca do avesso pode nunca mais voltar,

Besteira, não há temores fora que sejam maiores que os de dentro,

E quem passaria a vida no escuro, perdido em si mesmo,

Quando se pode abrir os olhos para naqueles olhos se encontrar,

Agora se fecho os olhos não é para minha prisão,

É puramente para sentir o que os olhos não puderam explicar,

O que sinto quando sinto seu cheiro, o que sinto no seu abraçar,

E agora eu te vejo ao avesso e não me sinto só,

Meu olhar gravou sua imagem e tatuou seu sorriso neste meu coração,

O mesmo que em segredo se manteve vivo ao avesso.