O Menino atrás da Pira

Dentre sentimentos nostálgicos cósmicos,

Me pego em lágrimas e sorrisos cômicos,

Pois da tristeza dos meus olhos vieram o pensamento,

Do escape de um sofrimento.

Num piscar fui atingido pelo vento dos montes,

Passávamos por duas pontes,

Íamos de encontro a pira petrificada,

Que poderíamos fazer nascer outra canção amada.

Subíamos cantantes, todos de corações cortados,

Pois somos os fugitivos dos machucados,

Os barulhos eram dos instrumentos pesados,

E dás mágoas nos passados.

Cada um colocando suas coisas em chão petrificado,

Nenhum momento conseguiam se achar parados,

Os animais do Éden juntos por mais uma orquestra,

Debaixo da poderosa Mão Destra.

Só Deus saberia a localização desses seres,

Todos com grandiosos poderes,

O da música e sinfonia,

Fugindo da urbana cacofonia.

Cada um carregava um pecado incalculável,

De almas deploráveis,

Com o coração incurável,

Mas de essências tão amáveis.

Cada um jogava sua tora,

Símbolo que outrora,

Era sua mágoa para a pira,

Quem queria chorar, pegue-a e atira.

As primeiras brasas ardem fumegantes,

Já estavam de almas gritantes,

Chegamos e nos preparamos,

Nós oramos,

Nós cantamos.

Individualmente encontravam-se nas rochas,

Com suas pequenas tochas,

Jaziam em prontidão naquele luar,

Preparados para fazer o instrumento cantar.

Brilhavam-se entre os sonetos,

Fazendo das cordas seus brinquedos,

Eu abraçava meu violino relutante,

Pois era o membro novo, iniciante.

Mas chegou um momento que ouve silêncio,

Meus dedos todos tensos,

Apreensivo e até desesperado,

Eu havia começado.

Na hora que comecei,

Olhei,

Admirei,

Todos me olhavam através do fogaréu,

Labaredas tocando até o céu,

As arvores cochichavam no uivo do vento,

Eu estava me vendo,

Lento.

Acabou que alguém começou uma canção,

Começaram a cantar,

Me deixei chorar,

Me permitir ajoelhar.

“Sei que há dor,

Que existe contenda,

Mas isso não é amor,

Se desprenda.

Pois nesse fogo de julho se debruça,

Esse violinista se descubra,

Que se isso não é amor,

Então que não seja desamor.

É nesse raspar de linhas que dizemos: Respira!

Pois nós só vemos o menino atrás da pira,

Há todo um fim nesse recomeço,

São todos os pecados que no fim vos cresço.

Somos todos os perdidos do paraíso,

E para isso digo a vós,

Atem os seus nós,

Segura nessa mão,

Acalma esse coração!

Menino por trás do fogo quem tu és?

Que nos bem admira e faz ficar em vossos pés,

Quem es tu que roubaste o coração da lua?

Qual o tamanho do seu egoísmo que fazes de tua canção paixão tua!

Pois menino moço agora convém,

Que hoje não é só mais um dia,

É dia de ir além,

Faça-me um amém.

Por mim digo que confio a ti meu coração,

Conseguiste fazer de nós tua criação,

Bem-vindo ao novo lar,

Que ninguém nunca vai te abandonar,

Somos quebrados,

Desamparados,

Mas se isso não é amor,

Nós então não somos amados!”

Deus meu e dessas crianças,

Por que permitisse tantas mudanças?

Que Te fazes pensar que desta pira vira cinzas,

Mostra-nos os vossos tons de tintas,

Sois aquarela ou tom pastel ao teu ver?

Nós só queremos cumprir com o Teu querer!

Por que me refresca a memória tão dolorosa,

Me fazes lembrar dos cheiros de rosas,

Daquele monte esquecido?

Será que não se cansas do meu coração partido?

Aquele céu estrelado,

O Teu ouvido inclinado,

Pois já não sei o que é areia nem mar,

Como poderia ser filho do luar?

O menino atrás da pira,

Ele ainda respira,

Mas ele pira,

Ele se retira.

Não aguenta mais a sensação angustiante,

Deste coração palpitante,

Sentimento retumbante,

Jazes amor nesse semblante?

Por que quero me afogar em lágrimas e louvor,

Onde está o meu ardor?

Aquele ar quente nas costas enquanto toca,

Quem se importa,

Comigo que se pegou chorando na água de amaciante,

Que colocou a testa no chão feirante,

Passa noites sem dormir se sentindo inseguro,

Procurando sujar coração tão puro?

Colocando planos nessa cabeça sonhadora,

Fazendo sentir culpa essa alma pecadora,

Quantos óculos deverei tomar de lágrimas,

E permanecer nessas eternas lástimas?

Isso dói! Isso machuca!

Dessa dor me amputa!

Coloca-me no colo que eu tanto desejei,

No seio que eu tanto chorei,

Naquele sorriso de presa amada,

Naquelas mãos encantadas.

Deus onde fica o meu amor,

Por dondé que desaparece a minha dor?

Me enchi de amor próprio,

Transformei em meu ópio,

Mas continuo indignado,

Por ser indigno filho do pecado,

Da ira que me consome diariamente,

Poderia me fazer sorridente?

Eu sinto falta daquelas costas manchadas,

Dos meus dedos em seus cabelos enrolados,

De senti-la no meu peito cochilando,

De estarmos cada vez mais nos amando.

Agora que encontrei a mim mesmo em uma mulher,

Por que devo passar por antigo sentimento sequer?

Relembrar das pessoas que nunca voltarão,

Meus amigos, meus conhecidos, meu irmão,

Seria nós parte do paraíso que tanto falamos?

Porque então em mente e sonho nos calamos!

Minha trupe, minhas cordas douradas,

Todas elas enferrujadas,

Trincadas,

Acabadas,

Enforcadas.

É tanto esforço esquecer para depois lembrar,

Mui ódio se forma para depois amar,

Só quero poder viver o hoje e o que vem preparado,

Por que eu abro a caixa do empoeirado?

Eu só queria ser amado.

Se estou feliz e demonstro clareza,

Com toda destreza me pego desprevenido,

Estava como antes naquele monte quando me tem ouvido,

Consigo imaginar a Tu inclinando-se para me ouvir,

Poderia não me deixar desta vez ruir?

Eu realmente não quero quebrar,

Tudo que eu queria era amar.

Hoje amo e sou amado,

Mas e este coração apertado?

Olhando diariamente para esse porta retrato,

Olho-me que sou todo endiabrado,

Esse vácuo em meu peito que puxa minha mão,

Poderia me matar então?

Pois como eu prometi a ti aquele dia:

“Que um dia vivo estaria,

Que me reconstruiria,

Sorriria,

Amaria.

Apontasse o violino como espada no pescoço,

Estando somente no osso,

Sou aquele que se opõe ao frio do inverno,

O próprio filho que luta no inferno,

Eu sou a semente da calamidade inevitável,

Mas eu sou a incógnita do amável,

Aponto a ti ó Deus, este instrumento do destino,

Pois sou de mim o eco do próprio Hino,

Que de morto, só tenho o fim de uma hipocrisia,

Sou o renascer de uma amável tirania,

Pois prevalece o que é ser e amar,

E esse ciclo vicioso estou posto a recomeçar”.

Eu não me esqueci dessas palavras quando estava hoje a chorar,

Segurando os meu óculos enquanto a roupa estava a lavar,

Por ter transformado meu monte numa pilha de corpos,

E todas aquelas rochas em lousa tumular.

Me senti no reflexo da água cinza e olhei em meu ser,

Estou hoje o melhor que posso me querer,

Me amo me quero, até me consumiria,

Mas essa honra deixo para mulher mia.

Mas digo que a labuta é atemporal,

Traz sofrimento descomunal,

É um desafio diário de espinhos e vergel,

Mas quebrarei tudo com sabor de mel.

O menino da pira vive arduamente,

Mantém todos em mente,

Dói sangra e faz querer chorar,

Mas nunca penso em me acabar.

Lembro das palavras que o vulto celeste me recitou:

“A ti, o trabalho hercúleo de viver,

A eles, os ventos dourados do perecer,

És diferente de alma alegre,

Pela grande depressão que vos celebre,

Deus mostrará a face da impiedade,

Pois o pior ódio de um Pai,

É o filho não se amar de verdade,

Traz-se o consumo egoísta de sua cria,

Que não ama a imagem do Pai,

Por fim se amaria.

Digo a tu, tom pastel do azul cerúleo,

Terás teu vermelho num amável acúleo,

Mas que irá doer do veneno até a futura semente,

Tenha sempre em mente,

Que por mais que se sente sozinho no momento,

O antigo juramento,

Nunca será quebrado,

Pois me contento,

O seu poder de amar,

De perdoar,

É maior do que seu odiar”.

Acaso paralelamente veio as palavras do Demônio mais humano:

“Que desta sobreviver mundano,

Deste mistério arcano,

Nessa noite é uma pira de funeral,

Mas não é o final,

Sabemos sua luta,

Sabemos sua dor,

Mas se era para ter fim,

Era tudo menos amor.

Não necessariamente o amor próprio morre,

Ele escorre,

Molhando suas raízes,

Afogando as atrizes,

Olhe a tu até o ano bissexto,

Tu serás amor,

Tu és terso.

Acredito e confio ao futuro que vem e já sei,

Tu serás Rei,

Mesmo que os súditos e sussurros pairem pelo castelo,

Não deixe de manter o Elo,

Lembre-se do que passou e irá passar,

Mas não deixe o amor acabar”.

Hoje, nesse túmulo secreto que vive em memória,

Deixo morto o meu eu escória,

As lágrimas limpam meu coração sangrento,

Num processo de recuperação lento.

O menino da pira se mantém erguido,

Mesmo pelo passado perseguido,

É o símbolo de sua própria paz:

São todas consequências do que o amor lhe traz,

Mantenha-se o que um dia prometeu para si mesmo,

Voraz,

Atroz,

Capaz.

Hoje vê,

Hoje crê,

Faz a alma brilhar,

Vê o sol nascer.

Num sentimento de beijo aquecido,

Viu que o sol negro tinha desaparecido.

A madrugada ainda é longa e perturbadora,

Queria se deitar no braço de seu amor, está atônito,

Quer fazer realizar essas bodas sonhadoras,

Só querendo o bendito matrimônio.

Ferido ele dorme,

Apaixonado faz sua alvorada,

Melhor ele se torne,

Sente saudades da namorada.

Finalmente seu coração acalmou na madrugada,

Está de coração choroso, de alma cansada,

Mas cansou principalmente do sentimento de pesar,

Tudo que precisa é deixar isso passar,

“Acalma teu coração”,

Disseram todos aqueles que o amaram,

Lembra da música que o acalmavam,

Pode ser que ele durma agora sossegado,

Pois cada mão de quem o ama está pousado.

Passam-se horas, dias, anos e eternidades,

Nunca esquecerá dessas canções,

Só mesmo a santíssima trindade,

Passa aquecer nossos corações.

Deus me perdoe o filho concedido,

Só estou um pouco perdido,

Mas não deixei de trilhar,

Muito menos de amar,

A mulher que eu quero me casar,

Os amigos que irei reencontrar.

Corvo Cerúleo
Enviado por Corvo Cerúleo em 19/01/2020
Código do texto: T6845198
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