Reinvenção do amor

"A palavra Amor está quase vazia.

Não tem gente dentro dela." Manoel de Barros

É preciso reinventar o amor

tirá-lo de suas várias camadas

que lhe foram impostas

ao longo do processo civilizatório

ou na construção de formas mais sutis de tortura

pra se contrapor aos tempos de antanho

A cada nova camada

mais sutilezas o mascaram

ou o faz um estranho no ninho das emoções

O que se faz por amor?

Desde a versão do amor romântico

muito se perdeu sobre o tal sentimento

é como se para amar

o comportamento

tenha que seguir regras quase que universais

ou quiçá apenas culturais

Que amores são possíveis?

aceitos?

cultuados?

Uma das camadas mais duras

que são invólucros do amor

é o ciúme

que leva à posse

à desconfiança

ao sofrimento

ao transbordamento

A solidão vai se adonando

de quem foge de tudo isso

que não aceita todas essas filigranas

nas quais submergiu o sentimento

Mata-se em nome do Amor

estapeia-se em nome do amor

chantagens de todo tipo são feitas em seu nome

Excesso de quê?

Crenças de todo tipo

teorias variadas

doutores

influencers

colches

pastores

padres

xamãs...

São muitos os que ditam regras

pra se conseguir o nirvana

(Como se possível fosse)

ignorando que amor de verdade

é passarinho arisco

que não aceita gaiolas

impunemente

Assim como os tarólogos

os quiromantes

livros de auto-ajuda...

Todos ansiosos

querendo juntar seus caquinhos

buscando um caminho

que os livrem da nefasta solidão

Quero um amor

urgentemente!

Quem fica só

só pode ser demente!

E o amor foge assustado

diante dessa busca frenética!

Pausa...

É preciso construir uma ruína pra o amor

Uma tapera assim em meio ao nada

deixá-lo lá abandonado

Ele,o AMOR,

precisa recuperar sua incivilidade

se livrar das camadas que lhe foram impostas

em nome da salvação de um mundo insano

de uma falsa humanidade

O amor não é OFF

é IN!

Quem não entende de solidão

muito menos entenderá de interlocução

de convivência

de entrelaçamentos

com amanheceres

e pores do sol

Fiz uma tapera de adobe

de porta e janela

de frente pra uma colina

Tranquei o Amor lá

e estou à espera

de sua decantação

Recuso-me

a ser mais uma na multidão

buscando algo inexistente

de uma perfeição irreal

como tantos que se perdem no oco da existência

e se olvidam que

é preciso saber da amizade

da cumplicidade

da solidariedade

da empatia

pra viver e/ou falar de Amor

Abandonei o amor

numa tapera imaginária

pois o quero

livre de tantas camadas civilizatórias

que lhe vedaram os olhos

para as minudências poéticas

tão preciosas

Ele renascerá como Fênix....

Amarília T Couto