ESPELHO DO TOUCADOR

Quando uma mulher se solta,

e aos seus cabelos longos,

algo acontece de se ver.

De se ver, não de se tocar.

É que o mundo se acende no ato,

e, luminescentemente, clareia,

aplacando-se à qualquer cizânia,

quando a Penélope se penteia.

Dá-nos a vida um fugaz momento,

no vislumbrar da mulher

aos aprontos para o adormecer.

Não é o corpo, receptor de todo engano,

nem a noite, suave fim da chegança,

mas, sim, o gesto da mulher ao toucador,

um dar de mãos displicente, lânguido

e lancetador, deslizando seus dedos

pelas melenas. Este sim é um sublime

alumbramento que nos conduz à idéia

de perfeição, à qual costumamos olvidar.

Ricardo S Reis
Enviado por Ricardo S Reis em 19/01/2007
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