Bicha

Homengem a um amigo que foi agredido em Salvador em um início de carnaval e por coincidência eu passava na hora exata da cena.

Bicha!

O grito veio lá da calçada

o rapaz de andar inseguro parou

depois seguiu lentamente

Bicha!

O grito veio mais forte

mais perto

mais agressivo

O rapaz acelerou os passos

mão pesada sobre o ombro esquerdo

voz de "bofe afetado"

tou falando com você "viado"

tapa no rosto

ninguém ligava

parecia ser normal

A voz dominava a cena

o monstro musculoso

adiantou um soco na boca

o sangue escorreu

o rapaz caiu

o monstro ameaçava chutar

o rapaz protegeu o rosto

chorou antes de receber o golpe

não viu o poeta

não viu a porrada na ponta do queixo

apenas encolhia-se mais e mais

até tirar as mãos do rosto

enxergar a roda humana

o monstro deitado no chão

o poeta perguntava sereno

mais alguém quer bater no rapaz?

Praça da Piedade em Salvador

ficou pequena

de pé

o rapaz agradeceu

abraçou o poeta e ouviu

não chore essa dor

a Bicha agora está deitada

talvez seja bicho

você precisa eleger a poesia da sua vida

cantar

desprezar o medo

reagir

frustrar os agressores

olhar nos olhos

você não deve nada a ninguém

agora siga

nunca mais pare quando ouvir besteiras

Poetas reagem além das palavras!

Chico Nascimento ou Magonleji
Enviado por Chico Nascimento ou Magonleji em 05/05/2012
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