Vila Rubim

De manhã cedinho ainda dormindo ouvia

Os botes ecoando tótótótótó que saíam do cais para pescaria

Da janela do meu quarto do outro lado a praia da Ilha eu via

Enquanto o sol fraquinho preguiçoso nascia

O outono amanhece lento no horizonte da Vila

Em Caratoíra nos jardins da praça desabrocha a vida

No casarão branco de varanda longa, Dona Nicota, minha madrinha

Prepara a mesa do café pra começar o dia

Os remadores põe n’água na rampa do Álvares seus barcos

A Duarte Lemos marca o vai e vem das donas de casa na avenida

Na Ilha do Príncipe batem bola no aterro os moleques pardos

O Mar e Terra inicia a lida, prepara nas marmitas a comida

Em frente ao Clube Náutico a porta do boteco sobe

Seu Nino abre a barbearia, franzino

Do Morro do Quadro que subia pela São Jacob

Desce a ladeira de rolimã o menino

Na Vila Rubim a segunda agita do Mercado

O feirante espalha os apetrechos, monta a barraca

Aguarda do cliente apressado o trocado minguado

Bem debaixo da ponte agora seca, da chuva molhada

No Jardim da infância do Parque Moscoso vê-se o pátio

Em frente ao Agostiniano das freiras de hábito

Os garotos, pra lá e pra cá, correm no parquinho da escola

As meninas sem cessar brincam de bambolê e pular corda

Vovô Pirajá desce a ladeira pro mercado com a sacola na mão

Tia Maria mata a galinha pro almoço no escuro do barracão

Maria preta de avental velho acende a boca do fogão

Dona Osvaldina vem do Rabaiolli trazendo na cabeça um trouxão

Salto no ponto da São Jacob subo rápido para casa rosa do Vovô na ladeira

Vejo à direita a São Thomé, onde a vizinhança barulhenta se ajeita

Logo depois à esquerda a Santo André curtinha que dá na Igreja

À frente a Dr. Thompson que sobe o beco pro Quadro onde o mendigo se deita

Nas festas de São João sobem coloridos cheios os balões

No céu brigam de linha com cerol pipas aos montes

Compra-se no Bazar Iara as cabeça-de-nego e rojões

Guris correm em volta da fogueira no pique-esconde

Corro suado, cansado aqueço o coração com as brincadeiras de pé no chão

No tanque de pedra que escorrega tomo um banho frio de sabão

Bebo na cozinha, da talha de barro, a água fria

Adoço uacataca do homem do quebra-queixo que sobe a via

Da minha infância, longe, tenho saudades

Da Vila Rubim da minha família, das minhas raízes

Lugar de todas os aromas, cores e matizes

Onde reencontro minhas fontes, minha inspiração, minhas matrizes

Era só felicidade na rua São Jacob.

Fábio Pirajá
Enviado por Fábio Pirajá em 10/05/2007
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