ODE À MORTE

Abre sobre mim teu manto de sombras

Inefável penumbra do imponderável

Olha-me com teus olhos antárticos

Meus faróis já apontam glaciares estrelas

Todos já ao passar me ignoram

Envolva-me no negrume deste tecido de dores

Crispe meus músculos com teu hálito acre

Ponha termo em toda a ruína ilógica, escatológica

Cronológica irreversibilidade do teu toque

Já me quedo agônico por décadas

Como se fosse morte parte dos suspiros vitais

Estabeleça tua irrevogável sina de ausência

Instale a demência pra que não sofra ao partir

Beija-me com a hipotermia dos teus lábios secos

Castre meus movimentos um a um, faz-me boneco

Torna-me submisso aos teus mórbidos desígnios

Imponha-me uma morte cósmica e silente

Veemente perda súbita de vida sem decadências

Sem as subserviências irremediáveis do morrer vão

Acolhe-me Tânatos sob tuas asas e teu férreo coração

Como acolheste Leônidas e seus trezentos de Esparta

Numa nuvem de setas que tornou noite o sol da manhã

De-me guarida sem rancores ou mágoas

Posto que cá estou entregue e despojado de armas

Violentado pelas imperfeições e escárnios

Impotente para seguir clamando nas areias

Não quero o presente da ressurreição

Pois o recomeço só me traria mais involuído

Denegrido, maculado pelo meu descaso em vida

Essa noite quero estar só, prostrado naquela mesa

Pensando no que não fiz

Por não saber ou não querer

Impulsionado por um ócio lacerante

Ou por inebriante ignorância como o seco vinho

Quero uma extinção absoluta e irremediável

Como a morte dos elfos e das fadas

Que nunca nasceram

Sem a transmutação da matéria

Quero extinção etérea como o fogo de uma vela

GIBAWRITER
Enviado por GIBAWRITER em 21/06/2008
Código do texto: T1045196
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.