Delírio final

Ouço sussurros na névoa

Vejo sombras no lago profundo

Sinto a noite me envolver aos poucos

O frio vem me dizer palavras sádicas

E me entorpecer em brisas no escuro

A estrada parece cada vez mais longa

A silhueta do horizonte desaparece na noite

Aonde eu fui parar?

Conheço tão bem a noite

E ainda assim me perco em seu véu de ilusões

Eu procuro respostas, rostos conhecidos.

Mas encontro apenas pedras

Encontro apenas ruas sem saída

Florestas sem calor afundadas na mágoa

Rostos enegrecidos por eras de solidão

Ao longe as criaturas da noite me cercam

Espreitam nos cantos e por entre

As altas copas de árvores sem folhas

Olhos lentamente despertam

Uma infinidade de sons quebra o silêncio

Eu corro ofegante em tropeços

Nada pode me impedir

Continuo marchando rumo ao breu

De súbito tudo parece mais longe

A dificuldade marca meus passos

Meu caminhar diminui

Deixo-me envolver pelo medo

Caio no chão num último tropeço

Não adianta mais fugir

Depois de tudo o que passei

Meu único descanso é a morte

No meu último suspiro sem sorte

Tento me erguer em um ato de força

Mas ninguém me ajuda

Nenhuma mão me puxa de volta

A noite sorri com olhos faiscantes de maldade

Mãos negras me envolvem em um veludo frígido

Deixo-me levar pelos sonhos

Em um sono perturbado de dores

Em um último delírio de cansaço

Uma última visão amarga e sem cores

Na qual me enxergo perdido e sozinho

Definhando entre quatro paredes de alucinações

Vejo-me desfalecer debaixo das sombras

E afundar atônito por entre discórdias da morte