Que o verbo se faça carne e habite entre nós

Hoje não há palavra que saia por minha boca.

Sentimentos que me calam, agarram a sanidade.

Emudecem o poeta e apagam a poesia.

É vida que escorre pelas calçadas.

É uma prosa revirada, meio crônica, meio comédia.

Olho-me no espelho.

Vejo um semblante mudo, escuro, cheio de reticências

acima de um sorriso frio.

Encerraram os verbos num único ato de silêncio.

Os artigos se indefiniram perdendo sua virilidade e seu plural.

Etéreos se tornaram os substantivos.

Ocos, abstratos, impalpáveis e sem sentido.

Nenhum adjetivo se impõe ao sujeito oculto, solitário, passivo,

sem um pronome reto de um terceiro qualquer que o suprima.

Os numeros que conto se perdem no tempo da eternidade.

Com o que penso, remexo e enlouqueço

sem nenhuma lógica, preposição, conjunção ou propósito.

Apenas espero, muito em superlativo absoluto.

Não espresso sentimento algum,

frio como um moribundo a velar as interjeições fugindo a galope.

Ao meu lado, ficaram os advérbios.

Companheiros invariáveis a impulsionar mudanças.

Eles não se importam com o que faço ou deixo de fazer.

"Agora" está sempre presente, a qualquer tempo

desde os primórdios da imperfeição.

Ação! É tudo o que me pedem,

pois só se muda o que aconteceu.

Um verbo que venha a me por em movimento

para que o aqui-agora faça acontecer

afirmações acima das dúvidas

com toda a intensidade e a qualquer modo.

Que o verbo se faça carne e habite entre nós...

_______________________

Poesia composta para o mote de Charlyane no Fórum Poesia On-line do dia 8/9/8. Para ver o fórum, acesse:

http://www.recantodasletras.com.br/forum/index.php?topic=4148.0