VOO 447

Uma turbulência... Um arrebatamento

De vidas em plena efervescência

Fluência de almas no seu pleno direito

De ir e vir, de voar e de se evadir

Com um tchau caloroso, um aceno, nenhum adeus

Estou certa, naqueles “até breve” ou “até um dia”,

Nunca "até que a morte nos separe"

Ou que lhes detenha os projetos, ceife sonhos,

Intercepte corridas, atrás do provável,

Do aconselhado, do muito pretendido...

Viagem de volta ao seio do Pai,

Nos braços tentaculados do destino

Que a tudo espalhou na profundidade

Em forma de mar

Que não quis assinar a obra imperfeita,

A página virada de repente, em parcos segundos:

Uma lua de mel, um curso, uma especialização

Um desejo acalentado há muito, um aniversário,

Outros não revelados, reticentes,

Desejos vários que adentraram a aeronave segura

Contra a insegurança do próprio existir

Que em si não basta, quando uma força maior

Pede mais de cada um, não apenas de 228 almas,

Mas de milhares de outras que se sentiram

Órfãs, abandonadas, decepcionadas, roubadas...

A mancha que se alastrou quilometricamente no mar,

Não era mesmo do avião em seu descaminho

Mas um reflexo de uma marca indelével no peito

De cada um dos que permanecemos

A suplicar o consolo dos que lamentam,

Cuja única senda

Foi ter amado demais.