Quimioterapia

E eis que se troca a Esperança

pela Espera.

A dor me desespera

e a vida me onera.

O frio me entorpece,

a comida não me apetece

e a maldita "quimio" que nunca desce.

O que foi riso desaparece

e do resto, a gente esquece.

Inútil pensar no carinho que enternece.

Na voz que antes me excitava e agora aborrece.

E no outro corpo que já não me aquece.

Ao meu lado outra vida desaparece.

Um anjo que fenece,

um lírio que falece

(eu queria rezar, mas não sei a prece).

Voltei para a conhecida Estrada.

Caminho do Nada

e sem alivio d'alguma parada.

Tento lembrar da moça bonita

e dos planos que sonhamos

(e que nunca realizamos).

E pensar que ela,

ao entrar em minha vida

compensou esse caminho de pedra não polida.

Neo, novo, Neolítico . . .

que me anda qual paralítico.

Aumentam-me a dose e a inconsciência.

Mas ainda masco a impotência

que me sobrou de tua ausência

(favinho de mel,

se soubesses o quanto houve de Céu

nos momentos em que me tirastes do Léu . . . ).

Atrás do vidro

revejo meu reflexo moído.

E o quão doído

é esse sofrer sem sentido.

Noutro poema escrevi

que muita vida já comi.

Agora, é chegado o momento

de findar o sofrimento.

De chorar o último lamento,

de sorrir o penúltimo contentamento

e de saber que nada foi em vão.

Tomei a vida por usucapião

e agora a devolvo esticada.

Talvez melhorada.

Certamente modificada.

E plenamente realizada.

Ao meu filho Thyago.