TUAS AMARRAS

Teus ventos já não inflam minhas velas

Há calmaria e silêncio nos meus mares

Outrora revoltas e encrespadas águas

Tentei navegar por tuas vagas

Como um marinheiro ávido por descobrir

E num sopro alísio me afastaste pra além

Mil amarras subjugam teu amor

Se é que te bafejou um dia tal sentimento

Sonhei estar num país distante, sem leis

Encoberto estava pela sombra da lua

A penumbra a mim tudo permitia

De sombras furtivas eram meus sentires

Numa quaresma quase eterna

Longe dos olhos de um Deus morto

Era um tempo permissivo e desregrado

E então eras completamente minha

Sem subterfúgios a te fazer esquivar-se

Cada milímetro da tua pele percorri

Esquadrinhando e vigiando teu sono

Desenhei mil vezes teus contornos

Tentando decorar-te como a um poema

Respirei teu calor e sorvi tuas gotas

Estive contigo vinte e quatro horas

Miríades de segundos de puro mel

Alí só vicejava a felicidade

E por vinte séculos nos quedamos juntos

Promíscuos na confusão dos lençóis

E já falávamos as mesmas coisas

Pois nossas bocas não se apartavam

Nossas cabeças ocupavam os mesmos limites

Desafiando a física dos espaços

Nossos sonhos trilharam as mesmas sendas

Mas nestes dias já não me olhas

Com os mesmos olhos de ontem

Já não procuras estar nas minhas fronteiras

Partilhar teu perfume e o suor da tua pele

E eu simplesmente me calo

Fico mudo de poesia