Pendência

Eu deveria ter segurado o tempo,

paralisado a areia da ampulheta,

impedido o movimento do relógio,

mas nada que eu fizesse me devolveria a paz,

a cada lembrança de toda a dor que lhe fiz sentir,

meu espírito se contorce em agonia,

ressentido por essa mágoa sem perdão,

nauseante de minhas ações passadas,

de um caminho sem voltas, sem mudanças,

arrependimentos tardios sem efeito,

tentativas tolas de remediar o impossível,

deixando se esvair toda a possibilidade de redenção...

Eu deveria ter cobrado respostas ao destino,

girado ao contrário a roleta da vida,

lançado ao vento o baralho do futuro,

mas tudo que eu consegui imóvel foi ser um ceifador,

dizimar cada broto que toquei,

ver em chamas um jardim que me foi proibido,

ser penalizado por levar o caos onde havia fé,

viver acordado em meus próprios pesadelos,

acendendo lamparinas em igrejas para cada malfeito,

implorando por um milagre inexistente,

um reencontro de transformação pacífica,

uma oportunidade de acertar as contas comigo mesmo...

Eu deveria ter amado mais,

me concentrado no que era importante,

curado minhas cicatrizes em seu olhar,

escutado as palavras sussurradas pelo horizonte,

me esforçado para tornar todos os seus dias felizes,

mas moldei meu ego em egoísmo e vaidade,

quis ter tudo sem ter nada,

perdi a mim mesmo sem me dar conta,

vendi minhas crenças por sorrisos cínicos,

obtive meus 15 minutos de sucesso,

me vendo agora preso numa eternidade de escuridão,

só tendo meu remorso por companhia indelével...