Oceano
Cidade às costas
Areia sob os pés
O vento é frio, seca o meu rosto
O cheiro do sal enche os meus pulmões
Faz o meu espírito acender
Há um chamado, uma voz
Que grita ao meu ouvido a noite
Mais forte esta noite
Atiça os meus desejos desumanos
Me seduz com o toque suave de dedos sombrios e gentis
Estremeço
Rodeado de tantas pessoas
Das quais mal reconheço o rosto
Mal posso lembrar dos nomes
Das vozes
Ou o porquê sorriem para mim
O som das ondas supera a música
Me convidam a nadar
Um mergulho de misericórdia
Na violenta e escura imensidão
O aceito com alívio
Retribuo o beijo da noite e da solidão
Quando as estrelas me observam avançar na areia
Os pés quase não tocam o chão
Já estou despido de qualquer dor ou vazio
De memória e alegria
Do meu tormento e de emoções
Avanço, deixo tudo para trás
A cidade cheia de vida
Os rostos que sorriem
Os laços não rompidos
E a fome que consumiu os sentidos em continuar
Tenho só o oceano
A maresia inebriando a mente
O seu chamado cantado nas ondas
E sua promessa pairando na bruma do horizonte
Aqui nos encontramos de novo, Oceano
E te devolvo o corpo e a alma dos quais não soube usar
Permito que suas águas me banhem e renovem
Transformem
Me levem para qualquer lugar
Aqui nos encontramos de novo, Oceano
Aceito o frio que me machuca a pele
A água que preenche os meus pulmões, me faz sufocar
Agora já não há fundo nem superfície
Começo ou fim
Céu e mar são únicos
Escuros
Se completam dentro e fora de mim
Aqui nos encontramos de novo, Oceano
Deixe que as suas feras me partam aos pedaços
E que a sua fúria majestosa acalme o caos que arde dentro do meu ser
Quando a calmaria chegar, de suas águas farei parte
O sangue que corre nas minhas veias seguirá o fluxo das suas correntes
Refletindo tanto a lua quanto o poente
E assim, glorificando o sacrifício que faço ao te receber.
— Guilherme le Fay