Passageira (Para uma mãe que se foi)

Naquela noite eu não dormi

Naquele segundo eu desabei em prantos

Naquele dia eu não vivi

Naquele momento eu perdi meus encantos

Você dormiu naquela noite, como quem não queria nada.

E no dia seguinte, quando cheguei você estava parada.

O mundo parou. A luz apagou

Os pássaros pararam de cantar

Nesse momento eu deixei de acreditar

O relógio quebrou em mil pedaços inúteis

Os sorrisos sangraram em mil lembranças fúteis

Passageira da vida.

Você foi minha lua mais querida

Que iluminou as noites mais frias

E alegrou os mais chuvosos dias

Seus sonhos ficaram incompletos

Seus olhos ficaram sem vida

Seu coração parou com sons quietos

Seu mundo estacionou na última avenida

Passageira, que se foi sem me levar.

Sonhadora, que navegou em sonhos nas águas do mar.

Sei que não há mais volta nessa distância

Sei que mesmo assim ainda estamos unidos

Era um dia de sol quando se acabou minha infância

Era um dia normal quando o mundo calou seus ruídos

O sol laranja daquela tarde não se pôs

O sorriso parado na minha face se dissipou

Na mesa um intocado prato de arroz

No coração um buraco se formou

Anos se passaram desde o mundo ter desabado

E a lembrança continua a mesma desde aquele dia

Aquela tarde de frente para o quarto parado

Abandonei a minha velha trilha

Aprendi que um dia todos vamos para o céu

Se realmente tiver um lugar melhor

Porque na vida já passamos por tudo o que o inferno

Pode nos oferecer de pior

Passageira do destino, você se foi ao vento.

Passageira que me deixou aqui sozinho naquele momento

Deixou-me apenas uma certeza

A de que o mundo é pior do que qualquer avareza

Mas que pode ser bom, no momento certo.

Passageiros somos nós, em nosso destino incerto.

Deixo aqui apenas um lamento, do adeus que nunca te dei em nenhum momento.

Poema dedicado a minha mãe, Maristela Do Lago Müller, poetiza falecida em 1° de setembro de 2003.