::: UM SONHO ESCRITO COM SANGUE :::

Sou, talvez, um Poeta,

Sob o mármore frio da humanidade observando o mundo.

Rasgo o constipado véu da eloquência,

Deixo padecer as rimas na esquina do tempo

E sob um céu úmido das cintilantes lágrimas divinas

(Que os homens chamam de chuva)

Discorro o putrefato chão de minhas pisadas negras por pecados.

Na cinzenta massa humana de uma sociedade mórbida,

Minhas lágrimas se perdem.

Assisto meu distanciamento dos sonhos longínquos de amor e paz.

Minha alma fraca vê do meu corpo os cacos no chão rubro...

Na noite solitária os uivos são múltiplos de homem e besta-fera.

Como uma alcateia, meus males uivam constantemente,

Rasgam minhas partes, essas hienas, no limbo da existência.

Estou morrendo. Nada tenho senão o pranto sucumbente.

Nada tenho senão uma prisão construída pelas minhas mãos

E arquitetada pela minha mente.

Enjaulado... A noite é minha última companhia e esse verso...

A última esperança.

Tateio estupidamente a parede fria e rogo

Em brados silenciosos que não saem da minha boca imunda,

Mas que rasgam as paredes de um coração tolo.

Venho rogar com os dentes quebrados de rangidos doridos,

Rogo insolentemente com ulceras na pele

E calvos os cachos da minha fé.

Restam-me onomatopeias, porque meus verbos estão perdidos...

Na linha do horizonte procuro os afixos e sufixos das palavras certas

Para os erros da minha jovial imaturidade.

Ignóbil vernáculo preso pela inexpressividade da dor que sentes

É o que resta do Poeta sob o mármore frio da existência.

Meu clamor insurgente não rasga minhas vestes, pois estou nu...

Incapaz de explanar a vergonha de meu rosto sob o pó do deserto

Que a minha alma se tornou por minha invocação.

A minha lágrima perdida está seca e o drama desenhado.

Tens teus personagens, fútil Poeta.

Vede, na linha do tempo onde eles estão,

Pois vão agora dançar em sua pena abastecida com o seu sangue.

Bem há, ainda, que mistura este sangue com suas lágrimas

E escureça com os teus pecados.

Percebo que na minha bipolaridade, ainda sim, estou preso

Na figura continua da culpa e das manchas de minha alma poluída.

Os personagens são um Poeta decadente, um homem minguante,

E, um servo anêmico.

Rogo-Te, clamo-Te e brado sem demagogia à dor que sinto!

Rasgo minha face e queimo meu coração nas chamas puídas da existência.

Ponho-Te ao Teu querer o pedido de morte como pena

Ou julga-me passivo de vida.

Que a morte funesta advinda dos leões incautos, abarca-me se sou imperdoável!

Matem-me os meliantes naturais da vida e afoga-me o rio de lágrimas,

Porque se sou imperdoável minha respiração ofende constantemente!

Todavia, se me julgas passivo de perdão, concede-me o alento desejado...

Não Te atentes a fragilidade de meu espírito doente pelas rendições

Que no tempo curto de vida cedi...

Não olhes minha lascívia, nem meu libido repugnante ou minha fuga covarde!

Não observe com severidade os demônios a quem cedi por tanta dor.

Rogo-te, que por mais, aceite meu sangue negro e salve minha alma cansada.

Todo dia meu pranto se dissipa no horizonte

Ao ver denigrida as pisadas do sangue Crucificado.

Tenho fugido, mas não posso...

Assentado sobre quimeras metamórficas e indolentes

Discorro um gemido mudo.

- Tenho saudades de Ti... Cristo.

Dos cânticos, dos versos de amor e dos goles de paz.

Percebes que um discurso eloquente é à força da razão,

Mas um coração quebrantado discorre com as lágrimas d'alma.

Pois hoje, por Ti eu posso acreditar e, por isso,

Escrevi no céu um sonho...

Que agora construo as escadas para buscá-lo.