O VELÓRIO DO LOUVA-DEUS

Zuniam as cigarras

Nas folhas penduradas

Se queixando da catinga

Esticando a barriga

Varriam o chiqueiro

Com folhas de sabugueiro

Esbeltas formigas

De pernas retorcidas

Repicavam os gafanhotos

Trevos e louros

Prá empacotar o louva-deus

Que no inverno escafedeu

Os grilos de reclame

Pendiam nos baldrames

Pechinchando os refugos

Deixados pelo defunto

Um sapo cor de espinafre

Benzia o cadáver

Numa prece sem fundilho

Vertendo lágrimas de crocodilo

As abelhas zumbiam

Do proveito que faziam

Ali mesmo vendiam

O mel que produziam

Pernilongos sangue-sugas

Rondavam a múmia

Do louva-deus ressequido

Como um bando de vampiros

Na sombra dum cogumelo

Foi o louva-deus sepultado

No lugar mal-assombrado

Nem lesma passava perto

E minhoca muito menos

E numa folha de coentro

Carregada pelo vento

A alma do louva-deus

Subiu pro céu

Acenando o último adeus

Depois no lugar uma flor nasceu

NACHTIGALL
Enviado por NACHTIGALL em 10/04/2015
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