OLHAR DISTANTE

Quando olhavas para o horizonte, meu velho,

Pensava eu que te apegavas ao arcaico,

Velharias craquentas, empoeiradas;

Formas desatualizadas, sem uso.

Achava que perdias um tempo precioso,

Jogando de balde a mirar o horizonte opaco,

Que perdia o lustro a cada curva do caminho,

Amarelando a cada passo do tempo.

Pensava eu que não devias dispor assim o tempo – a mirar os idos,

Onde ficaram os cancros, nódoas e choros,

Que tanto amargor guardaram e angustia imprimiram,

Dos rancores deixados em prateleiras de sonhos vagos.

Pensava eu que devias olhar o futuro, vislumbrar grandes feitos,

Onde investir teu amor, tua luta e sonhar.

Devias pensar no novo, muito além do horizonte

– No azular da esperança que alumia o imaginar.

Quão tolo fui eu.

Não vi por entre os olhos turvos que o futuro está além da curva.

Não da que segue a estrada do destino, por onde sigo teu rastro,

Mas da curva do arco-íris, onde jamais chegarei,

pois lá ninguém jamais foi, a não ser bêbados caídos.

Não via a mente míngua, meu velho, querido amigo,

Que vislumbravas nos vultos teu belo doce horizonte,

A juventude passada, farta de alegria e risadas;

Todo empreender iniciado, realizando e acabando.

Não via eu que vias em teu passado todo sonhar renovando.

Ah, velho amigo!

Se eu soubesse tudo, como pensava que sabia:

Quantas novidades guardaras para mim.

Teria eu apreendido cada instante contigo,

Quando com os olhos lustravas o passado

– Teu belo horizonte, aurora de uma vida bem vivida.

Se eu soubesse quão jovem tua eras – menino a rever o tempo,

Pois a primavera vinha em teu quintal

Quando revivias tua juventude sem par.

Teria sido teu companheiro em sonho dourado

A garimpar tesouro em rumo temporal,

Pois sozinho no tempo tu ias e vinhas,

Sabendo que no passado é que temos vivido,

Porque no futuro não podemos deixar marcas,

Tampouco lembrança pra encher um dedal.

Hoje sou eu quem vivo com olhar distante,

A mirar o passado, onde tu também estás,

Meu velho amigo, com tuas relíquias

– Pérolas de vida que tinhas guardado pra mim,

Mas eu não sabia quanto valiam.

E, infelizmente, não vais mais voltar.

Wilson do Amaral