O amor sem amor

Ele que falar, mas não consegue;

Quer ligar, mas não consegue.

Anda de um lado a outro.

Está ansioso.

As unhas não existem mais.

Qualquer música o faz lembra-la.

Qualquer filme é igual a sua história.

Tenta dormir.

Apaga a TV, o rádio, a luz.

Vira para um lado.

Vira para o outro.

Não consegue.

Está agitado demais para dormir.

Então levanta, vai à geladeira, pega alguma

coisa para comer.

Mas não tem fome.

Bebe algo.

Mas não tem sede.

Começa o desespero.

Acende o primeiro cigarro.

Vai à janela.

Fuma muito...

Está gelado e chove fino.

Sente frio;

Mas não se agasalha.

Pelo contrário,

Sua frio.

Uma lágrima cai.

Não queria.

Então, a enxuga rapidamente.

Não aceita chorar por ela.

Mas não dá.

É inevitável.

Então cai em prantos.

Chora, chora, chora...

Chega a soluçar.

Fica com raiva do seu sentimento.

Quebra o porta-retrato com a foto dela.

Deseja e evoca a morte.

Sabe que não vai curar desse amor.

Luta para não perdoar.

Luta por não querer.

Luta para esquecer.

Mas sabe que é impossível.

E então resolve ligar.

Liga e desliga várias vezes.

Realmente não consegue falar

E, depois de muito esforço,

Convencido de que a perdeu para sempre,

A campainha toca.

O sangue começa a correr rápido pelas veias.

O coração vai à mil.

As mãos começam a suar.

O corpo estremece todo.

Devagar, chega à porta.

Tem medo da decepção.

Respira fundo e abre a porta.

Por um instante,

E sem aparente explicação,

Seu coração para de bater...

Era ou não era ela quem estava frente à ele?

Ah...

Mas também o que importa:

Sua alma não está mais aqui.

(Belo Horizonte 26/07/2004)