Itabira

Meu espírito altivo e vontade férrea vieram de Itabira.

Minha amada Itabira de tanta história,

de saudades do tempo que tinha tempo para ser criança,

de pureza tal como da Água Santa,

ainda longe das contaminações da vida adulta,

quando o futuro, nesse tempo inda longínquo,

se erguia orgulhoso como o Pico do Cauê.

Tempo em que as ruas eram calçadas de minério

e a letras aprendidas no colégio das irmãs.

Quando todas as casas contavam, quando nada, um século de construção e se dizia: - Nesta casa nasci, nela vou morrer.

Tempo em que o tempo era apenas uma sucessão de sóis e luas

sem que isso afetasse a vida das pessoas.

Um dia alguém descobriu que as ruas não eram asfaltadas

assim, para conforto dos automóveis,

na primeira volta do ponteiro do relógio,

sepultaram o minério que pisei na infância.

Na segunda volta do ponteiro do relógio

descaracterizaram a praça do Centenário.

O que fazer ? Era o progresso...

Quando o ponteiro completou a terceira volta

muitos bairros estavam irreconhecíveis.

Estávamos progredindo. O que fazer ?

O progresso, na quarta volta do ponteiro do relógio, acabou com o Pico do Cauê.

Ponto de referência e nosso orgulho mas, pensando bem,

Quem precisa de orgulho ?

Na quinta volta do ponteiro do relógio a fonte da Água Santa,

seria milagre ? transformou-se em poça de colibacilos.

Perdíamos a vida mas estávamos progredindo.

O que fazer ?

Na sexta volta do ponteiro do relógio

muitas das casas que conheci já não existiam.

Em seu lugar foram construídas outras estupidamente modernas( ou seria modernamente estúpidas ? )

Que importa ? Era o progresso.

Na sétima volta do ponteiro do relógio tínhamos uma nova estrada

que, prometiam, nos traria cada vez mais progresso

e, antes que esse progresso chegasse, levaram quase tudo que restava.

Na oitava volta do ponteiro do relógio

fui embora de Itabira

e não lamento estar tão longe

da Itabira que vivi,

e mais longe ainda, da Itabira que conheci

porque cada volta o ponteiro do relógio

me faz avançar num tempo

que me afasta de meu tempo

e, tão longe desse tempo,

também eu morri.

Dario Castellões
Enviado por Dario Castellões em 03/01/2007
Código do texto: T335370