O TREM DE FERRO

O trem de ferro, que menino,

do Rio de Janeiro me levava,

rompia ventos com uma impaciência

que, o fim da jornada, antecipava.

Apenas, eu ia absorto e inteiro.

Café-com-pão, piiuuiiiiiiii.

O maquinista, na curva apitando.

Eu só imaginava, pois, que não existia

(não se via) nenhum maquinista, nem curva.

Havia somente o dia se dissolvendo, ligeiro.

Eu, olhando pela janela, engolia com o vento,

o momento passageiro.

Não dava contas, na viagem, dos contornos

da serra mineira (que recupero na lembrança)

disperso que estava,

na sacolejante monotonia da paisagem.

Súbito, como no Sonho de Alice,

o olhar se fixava na casa pobre, de taipa,

que se via no meio da planície verde.

A casa, já entrada no escuro da noite,

pela lenha que ardia no fogão, mágica,

se iluminava.

Tinha um olhar conspícuo (a casa),

um olhar de eternidade, e vigiava

o trem de ferro em que também viajavam as minhas

conjecturas de criança, inócuas, inócuas.

E o trem, já na lonjura, com a pressa da chegada,

ainda, na curva, apitava.

Ricardo S Reis
Enviado por Ricardo S Reis em 18/01/2007
Reeditado em 20/01/2007
Código do texto: T350530