Efêmero, Agênero

Cortei o cordão umbilical, nasceu!

Deu-se de parto natural, gemeu.

Berrou para anunciar-se viva

num quarto de hora e meia da madrugada,

és tu, rediviva poesia inesperada.

Carne viva, viva alma,

examino-te a palma das mãos

pequenamente sagradas.

Na perícia do exame,

icterícia veio amarelar,

sacramentar o mal recém-nascido.

Providência. Banho de luz

para fazer jus à restauração.

Comprei-te macacão, não serve.

Vestido também não.

Cresceu um pouquinho, falou mamãe.

Não quis carrinho por mais que o ganhe.

Eureca! Dar-lhe-ei boneca.

Para espanto, desencantou-se, não quis.

Já não sei como chamar-te, despudorado.

Proclamarei-te, então, poema inominado.

Entre tuas pernas o nexo enlouqueceu,

esqueceu de segredar o sexo.

Que és então?

Crônica hermafrodita?

Deifica-se e safa-se da curiosidade humana.

És poesia, és poema, és crônica.

Castíssima és tu, ó maravilha sinfônica!

Baluarte efêmero, bibelô delirante-agênero.

Felix Ventura
Enviado por Felix Ventura em 22/11/2013
Reeditado em 10/08/2022
Código do texto: T4581819
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