ELEGIA

 





Me esfolas, me cortas, me cospes,
Sou a mosca flutuante
Que passa pelo gargalo:
Mexo as patas na garganta.

Sou a fome que ainda
Permanece, após a janta,
A mentira que tu contas
Para convencer os tontos.

Sou a herege, a sacripanta,
A que rouba, sem piedade
Os teus sonhos, e os destrói,
Vertendo-os na realidade.

Sou teu saco de pancadas,
A desculpa esfarrapada
Para tua incompetência...
-Na verdade, não sou nada,

Sou bem menos que tu pensas,
Mas me fazes de estrada,
De bandeira, que drapejas
E de alvo, que apedrejas
Para aliviar as mágoas
Da tua vida desgraçada!

Ah, se ao menos eu pudesse
Ser um pouco do que dizes,
Se eu tivesse esse poder
Que tu tanto me atribuis!...

Eu faria uma magia
Mostraria o quanto és nada,
E o quanto eu nada sou,
-Nem ao menos a tal sombra
Que atrapalha a tua luz!...

Hoje eu faço uma elegia
-Presta atenção, estás vendo?
Eu te peço que a escrevas
Na minha última pedra:
"Aqui jaz quem nunca foi,
E continua não sendo."





 
Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 17/03/2014
Reeditado em 03/11/2016
Código do texto: T4732264
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