Pés de chinelo.

Quando novo e confortável,

Couro macio, aveludado,

Pés de rico a usar.

No tapete ou guardado,

Maior parte do tempo no quarto,

Pouco tinha a caminhar.

Vez ou outra acontecia,

E da varanda ele via,

Um mundo novo a desbravar.

Queria ir na cozinha,

Mas o máximo a que ia

Era à sala de jantar.

Um tempo aprisionado,

E muito pouco usado,

Em outros pés foi parar.

Já saia ao mercado,

Tropeçava nos buracos,

Das calçadas do lugar.

Mas o mundo em que vivia,

Tinha muito mais alegria,

Aventura e felicidade.

Agora já meio roto,

Até rasgado um pouco,

Pés de andarilho foi parar.

Viu terras, estradas, montanhas,

Dia, noite, sol e lua,

E estrelas a brilhar.

Mar, rios, florestas,

A natureza mais bela,

Tudo para desfrutar.

Já então muito cansado,

Imprestável de tão usado,

No lixo foi parar,

Com a alma enternecida,

Por tudo que viu em vida,

Podia morrer, descansar.