UM ANJO EM MINHAS SOMBRAS
Estranho sonho:
uma obscena forma,
sem rosto,
invadiu minha noite
a me amar entre barro
e cinzas;
com afiadas unhas
vermelhas
alisava-me as carnes
– ou as rasgava,
já não me
lembro bem –,
um doce precipício
sugava-me com volúpia
o eretíssimo pau,
de modo que me fosse
impossível
alguma libertação
qualquer
- e nem a queria,
tal a febre e o delírio
do momento –;
de repente,
vi quatro asas: duas brancas,
duas negras,
a digladiarem
e a se amalgamarem,
fluidamente,
em meu ser;
ao fim, em estranho veludo,
nasceu uma criança
a resplandecer luz,
a seu lado, em lama bruta,
estava seu irmão gêmeo,
negro:
ambos também
um só ser,
filhos do amor
entre o sublime anjo
e eu.