A TRAIDORA II
Quando cheguei da última vez,
nem me houvera tempo de chover
sob as sombras de suas árvores
ou sobre suas embaçadas
lajes.
Vi, de imeditato,
sandálias atiradas aos chãos,
roupas espalhadas sobre a escada
e dois copos de vinho sobre a mesa,
enquanto “Whiter shade of pale”
tocava ao cd player.
Era, de fato, o pior castigo
à minha ousadia de sonhar impossíveis
e à minha soberbia com o manuseio
de luzes néon e de palavras
voláteis:
ao quarto, amavam-se
aquela que supunha ser minha
(só e eternamente minha) e outro pássaro,
velho e amorfo, por ela
ressuscitado.
Mesmo em angústia e dor,
se eu lhes dissesse que quase
me morri por causa disso,
mentiria;
eu poderia, na verdade,
era tê-los de minha mente dizimado
e a um severo apagamento lhes
ter destinado,
mas perderia, sem dúvida,
um grande e valioso aprendizado
e a triste mas poética visagem
do árido deserto,
fruto de como se amaram
(eu e ela) duas rígidas e desgraçadas pedras,
de anjos e querubins
disfarçadas.