A Montanha

I

Na frente o mar; dos lados vou nadar - sair e a montanha olhar.

Quero abraçar, alta o céu vai arranhar - a mim abençoar.

Lá vou chegar, montanha sei te amar - teu cume quero alcançar.

Com um véu te coroar, Cristo não mais crucificar - lá vou rezar.

Alguém acompanhar, ninguém desolar - e talvez desposar.

II

Fugir da maldição, ganhar saúde no coração - gritar para o irmão.

Na montanha tem o leão, o tigrão - lá no alto frutas e limão.

Me erguerei em ascensão, terei o céu na mão - para Eva serei Adão.

Com ela jogarei xadrez e gamão, esquecerei o pão - serei um bebesão.

Nasce no coração, amor uma boa aflição - não pare quero continuação.

III

Me cobri com seu manto, senti seu pranto - no entanto.

Não almoço mas janto, esqueci o desencanto - ficarei não sei até quando.

Para chegar esperei tanto, agora de manhã levanto - olho sem espanto.

Não mais tenho quebranto, rezei já sou santo, posso voar - até canto.

Repouso no recanto, aqui falo esperanto, árvores me entendem - é um encanto.

IV

Montanha faça jus, mostra tua verde luz - para o alto me conduz.

Tua força me induz, sonhos que produz - já não sou avestruz.

Fez leve minha cruz, não uso capuz; saro com ervas - há mentruz.

Subo a pé sem bus, não tenho status - até vivo com os jacus.

Oro a Jesus, no alto há uma luz - só o bem se traduz.

V

Montanha, você sempre me apanha - a fé é tamanha.

Sem artimanha, acolhe a pomba e a aranha - lá tem castanha.

Água pura é champanha, não se faz barganha - tudo é façanha.

Canto, ouço a Betanha, a garganta não aranha - nem a voz fica fanha.

Eu vou, alguém me acompanha? Ela vem e me ganha - meu braço apanha.

VI

Sempre jovem menina, dentro guarda uma mina, fora - muita adrenalina.

Tua cor ilumina, tem verde e albina - ser sábio me ensina.

Não tem dor nem angina, és nua sem batina - não usa gás ou benzina.

Parada é bailarina, sem sapato ou botina - não é santa nem cafetina.

Parece pequenina, mas é sábia e divina - tem uma lá na esquina..

VII

Inicia a jornada, lá em cima ela fica amedrontada - está paralisada.

No meus braços se vê abrigada, quieto, não digo nada - está gelada.

Tonta e assustada; mas olha apaixonada - se sente desarmada.

Presa fácil será atacada, parece machucada - vai ser desnudada.

Não quero mais nada, estás nua quase pelada - vai ser amada.

VIII

Sou o Maomé que vai, a faço tremer mas não cai - feliz grito "ái".

Outros gritam "uái", ela grita mas não sai - no Japão a gueixa e o samurai.

Filho onde vai? A procura de Adonai, peça por mim – pode ir que não cai.

Lá de cima gritai, ou como um pai - com voz suave falai.

Sobe num bonsai, assim você não cai, mas deste lugar - vê se sai.

IX

Teu solo é sagrado, lá Ele foi crucificado - mas não ficou calado.

Teu semblante abalado, deve ao alto ser lavado - bons ares respirado.

Lá não tem dor nem machucado, ninguém é magoado - o espírito é elevado.

Vai; seja abusado, só ou acompanhado, não seja Maomé - nem enjoado.

Não fique parado, te cuidada no cerrado, nem sempre - abra o cadeado.

X

Subir é lendário, suave calvário - lá terás o imaginário.

É um grande cenário, onde tudo é voluntário - nada arbitrário.

Saia do armário, você é o beneficiário - libere o peixe do aquário.

Pobre ou bilionário, esqueça o calendário - ou o crediário.

Ele não vai; deixe o otário; o livro, o dicionário, a escola – e o secundário.

XI

Tem perfume de flor; muito gosto e sabor - lá nasce o amor.

Ele é seu admirador, ela só quer amor, respirem - não tem filmador.

Seja na terra nadador, a seus pés um orador, escute - só faça amor.

De paquerador vira professor, o surdo ouvidor - adeus falso pudor.

O retrógrado vira inovador, o desiludido sonhador - o fraco tem vigor.

XII

Vem cá, traga um parente, aqui não é frio nem quente – só passe um pente.

É verdade, há quem não agüente, K2 não é para gente – mas não invente.

Do sofá levante, tome coragem e vai avante – da altura não se espante.

São amigos, ratos e elefantes, tem mais velho e infantes – nada é oxidante.

Pega um barbante, coloca um pisante – esqueça tudo dantes.

XIII

Esqueço a monotonia, trago uma companhia – na rede vivo uma poesia.

Tenho tudo que queria, fugi do que é fria – abandono quem me angustia.

O som não tem cacofonia, foi embora a azia – tirei uma radiografia.

Muito de bom não conhecia, agora estudei geologia – sem querer teologia.

Antes, todo dia, acho que um pouco morria – por muito pouco sofria.

XIV

Da montanha vejo o sul e o norte, não se pensa na morte – me sinto muito forte.

Toda hora é um esporte, nada que muito importe – acho que tive muita sorte.

Às vezes recebo um reporte, vem de aerotransporte – pede palavras que conforte.

Pode vir não quero passaporte, não carrego faca de corte – tenho um braço de porte.

Montanhismo é esporte, escalar é pra forte - difícil é o vento do norte.

XV

Sou lobo da montanha, só uma loba me ganha – um poeta da montanha.

Segui a sermão da montanha, fugi da maldição da montanha

– e senti a tentação da montanha.

Como lasanha, às vezes piranha – só quando me assanha.

Ganhei muita manha, agora picanha - só sem banha.

Tua imagem a terra banha, a sombra te apanha – vem pra montanha.

Esta é a manha; passar 40 dias e 40 noites no alto da montanha e...

– aceitar a tentação da montanha.

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Samoel Bianeck
Enviado por Samoel Bianeck em 24/02/2006
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