Preparativos para o fim do mundo

O poema cresce independente de mim.

Eu o escrevo, escolho as palavras, as poucas imagens,

procuro controlar minha ânsia de metáforas.

Eu o escrevo, mas ele não tem nada a ver comigo.

O mundo lá fora é o que interessa.

O poema me expulsa do calor do ninho.

O poema me expulsa dos ovos com a vida regurgitando.

Há uma guerra lá fora e só essa guerra interessa ao poema.

Se uma gralha grita, é para estourar a paisagem.

Se o melro voa de um lado a outro do rio,

é para me lembrar que tudo passa,

que não é este lado

ou aquele que interessa.

Aliás, nada mais interessa.

Interessa o que está fora do meu controle.

Um frio me gela a espinha.

Parece que vou quebrar.

O meu poema caminha na rua,

quebrando o cimento

e a insensatez humana,

com a sua carga de dor

e estupefação.

É como o fim do mundo.