LIRA BRANCA

Não calo o meu canto frente ao Olimpo que opera nas trevas...

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Amanheço...

Estou transparente.

Claro como aquela nuvem que sonhei.

Como a manhã que me acordou na grande realidade de todas as coisas,

[de todas as formas, de todas as cores.

O mundo cai. A Terra murcha...

Acho-me aqui. Inteiro. Na rua. No meio da rua.

Não quero o alto deste trono!

Não quero a supremacia dos covardes!

Não quero este vinho comprado com sangue inocente!

Transpareço no branco do meu rosto. O que este espelho me diz?

Hoje voltei-me para mim e me busquei na alvura que me envolve.

Vi um homem antigo que se esconde no claro da minha face.

Quis conhecê-lo nos meus olhos e nos traços de uma história.

E nos fios da barba...

E em minhas cãs...

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Amanheço na lucidez de um tempo...

E o mal faz tantas vítimas e quebra todas as regras e escarnece da dor.

Amanheço na lucidez de um tempo. E o homem dorme o sono das doutrinas...

Amanheço na lucidez de um tempo. E as máquinas cantam uma canção de ninar...

Amanheço na lucidez de um tempo. E revivo a História como um conto ligeiro...

A minha espada... Onde está seu brilho? Em que trilho insiste?

A espada insiste numa vereda clara... No amanhecer dos Anjos...

O que será quando a festa terminar e caírem as máscaras? O que será?

Qual será o sabor do vinho no último banquete? (Aves do céu... Vinde!...)

Qual será o hino de glória frente às labaredas?(Cantai! Fartai-vos, filhos da deusa!)

Comei e bebei e bebei e bebei! Embriagai-vos nas praças douradas da Grande Babel!

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Não! Não bebo desse vinho misturado! Dessa oferenda iníqua em altares do mundo!

Não bebo do amargo desse fel e do falso dessa máscara e das fogueiras malditas

[e da indiferença má e dos festins regalados

[e do rol das hipocrisias

[pois ferem minhas raízes e são roupagens frias

[pois não aquecem a alma e não dividem o pão

[pois esquecem os elos e ignoram o irmão

[pois renegam o abraço e produzem a guerra

[pois matam a vida e ferem a terra!

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Oponho-me e não calo – FALO!

Grito ao vento amigo – DIGO!

Trago a mão na espada – ALADA!

(Ó espada! Singra esse mar! Desperta outros ventos!

....E vem com a justiça da Pedra Real...)

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Hoje amanheci na lucidez de um tempo

[e vi minhas vidas no alvor de um novo dia.

Levantei a bandeira num monte escalvado,

[cantei minha lira branca,

[... e morri poeta.

Sidnei Garcia Vilches (29 de Janeiro de 2013)