Sobra de Circo

Cheguei de viagem numa sexta-feira e queria estar junto

de minha família durante aquele fim de semana, o máximo

possível.

Vi, então, anunciado a chegada de um circo. Há quanto

tempo eu não ia a um circo!

Arrisquei o convite. (É sempre um risco convidar um filho

de dezessete anos e uma filha de quatorze para um programa

desses). Mas, aceitaram até com assustadora facilidade.

Saudade?

Sentamos num camarote, bem perto do picadeiro, onde,

atentos, conseguíamos seguir todos os preparativos.

Apagaram-se as luzes.

Começou a música.

Entra o apresentador e, enquanto dá as boas vindas, um

desfile dá início ao espetáculo, com aquelas mulheres mágicas

em seus maiôs brilhantes e suas plumas coloridas.

Me veio um nó na garganta e me lembrei de como meu

pai gostava de me levar aos circos. E, também como mágica

comecei a recordar aquela época. Virei para trás e olhei lá em

cima a arquibancada mais barata onde ficávamos. Me lembrei

de como sonhava em um dia ser muito rico para poder estar

ali, num camarote. Mas acho que foi o circo que ficou mais

barato.

Meu sonho de trapezista; os tambores rufando no salto

mortal, nunca imaginaria de um dia ter tanto pavor de alturas.

Sonho de domar todas aquelas feras e, até mesmo, me

arriscar numa daquelas motos do globo da morte. Meus sonhos

foram voltando: ser equilibrista, malabarista, contorcionista,

engolir fogo ou não deixar os pratos pararem de rodar na ponta

daquelas varas.

Olhei para meus filhos e senti que neles também, havia

um olhar de sonhos seguindo o espetáculo.

O palhaço era, sempre, a peça máxima do circo mas, para

falar a verdade, com ele nunca havia sonhado.

Acho que as crianças sonham mesmo é com a realidade.

Porque, hoje, se alguma coisa parecida com o circo existe

em minha vida, é a eterna corda bamba.